Solidão

Final de tarde

Em uma casa com apenas uma porta e uma janela, uma senhora está sentada em uma cadeira. A altura da janela impossibilita que tenha uma boa visão da rua, mas seus olhos não estão na rua. Estão dentro de si mesma.

Inicio da noite

Em uma praça repleta de mangueiras centenárias, um velho caminha. Seus olhos estão cansados, a roupa suja e na mão uma garrafa de bebida. A garrafa cai subitamente. Encontrou quem estava procurando. Uma jovem de cabelos negros, vestido bem abotoado e sorridente. Caminhou em sua direção. Música começou a tocar, sua barba por fazer encostou no rosto da jovem, ela estava cheirosa. Assim dançaram, se beijaram e ele fez juras de amor.

Na casa com uma porta e uma janela, a senhora se levantou com um suspiro fraco, mas profundo para seus pequenos pulmões.

A noite avança

O velho ainda estava dançando com a moça Seu estômago dói, mas não solta o abraço.

Ela resolveu ir deitar, a cama era de casal, mas deitava de um lado só.

Dia seguinte, antes do final de tarde

A senhora sai do banho, penteia os cabelos brancos para trás. Passa talco no pescoço e um pouco de colônia. Arruma a cadeira que já estava no local, e senta.

A praça está silenciosa hoje. Avista-se apenas um homem caído abraçado com uma mangueira. Está morto.

Algumas semanas depois, final de tarde

A senhora sai do banho, passou talco, que estava quase no fim, depois a colônia. Sentou na cadeira que ficava próxima da janela. Em seu coração a lembrança que era sua companhia: O marido. Aquele que saiu um dia de casa e devido ao estágio avançado da doença do esquecimento, esqueceu de voltar. Lembrou de quando se conheceram, quando ela ainda era jovem e tinha os cabelos negros. Sempre tinham tempo para se embalar em um abraço, dançavam a noite toda. Agora o seu único abraço era uma lembrança.