Não disse adeus

Um dia a cidade cansou. Pessoas passavam rápidas ou lentas, mas todas indiferentes. A cidade já fora um das mais bonitas do mundo. Agora parecia uma pessoa de idade, que não consegue comprar roupas novas.

Primeiro foram embora os casarões, eram os mais orgulhosos, olharam a cidade ganhar forma ao seu redor, mas agora essa forma virava-lhes as costas. Não tinham a quem contar suas histórias e, antes que fossem condenados a viver o resto de seus dias com a cara pintada de tinta berrante, foram embora. Estão em um lugar onde são apreciados. Lá, suas rugas são reverenciadas e suas histórias são ouvidas pelos mais velhos e pelos mais novos.

Sua falta na cidade não foi notada. As pessoas continuaram a andar indiferentes. Assim em uma praça as estátuas de sereias resolvem ir embora, deixaram um chafariz vazio. Sua falta não foi notada. Estão enfeitando jardins floridos, aparecem nas fotos de pessoas sorridentes e deixaram de servir como banheiro para pessoas que tem casa.

A cidade ia ficando cada vez mais vazia, mas as pessoas não percebiam mudança alguma. Aos poucos, monumentos menos imponentes, começaram a deixar a cidade. Não foram tão apreciados quanto os primeiros, mas qualquer atenção é melhor do que nenhuma, eles pensaram.

Todos continuavam indiferentes, não sentiram falta alguma, pois a presença do que tinha partido, nunca fora notada. Outros prédios iam partindo, assim como casas, algumas com suas cores berrantes fizeram sucesso em lugares distantes. As pessoas voltam para suas casas, ou pelo menos aonde um dia havia tido um teto. A falta de teto em suas cabeças não foi sentida, não era a época das chuvas.

A natureza, como sempre, foi a última a desistir. As Mangueiras foram embora, os Açaizeiros também. Plantas menores e até as poucas Vitórias-Régias. Sem elas, os animais não tardaram a partir.

Uma manhã acordaram todos deitados no chão. Tinham fome, e estavam em um grande espaço aberto e vazio. Essas pessoas, ao contrário de todas as coisas, não eram bem-vindas em lugar algum.

 

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Praça Dom Pedro II – Belém, abril de 2018.

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