Damião era pintor de paredes. Não mencionarei o fato de ter sido presidiário. Foi condenado e cumpriu sua pena. Outro julgamento seria desnecessário. Ao contrário do que o seu nome pode sugerir, ele é filho único e não gosta de doces.
Conseguiu o emprego de pintor por intermédio de um amigo. O tal amigo passava muito tempo na farra com suas amantes, então colocou Damião para fazer a pintura de uma casa. Ela ficava em um bairro bem arborizado com mangueiras, e pela quantidade de paredes, previa que teria trabalho por um bom tempo. A dona da casa chegava. Olhava o serviço. Ele estava livre até o dia seguinte.
Após um longo dia de trabalho a tarde ganhava tons avermelhados e logo virou noite. A dona da casa não voltou. Esperou algumas horas, resolveu pegar algo na geladeira. Cada minuto que ela demorava aumentava a sua curiosidade do que poderia ter acontecido.
Ela não voltava. Foi ao banheiro. Banho. Sentado no sofá da sala. Adormeceu.
Acordava cedo. Naquele dia dormiu muito. Mesmo culpado por ter dormido ali, foi até a geladeira, comeu e bebeu. Nesse dia não pintou. Com a ausência da dona da casa, sentiu que estava livre do contrato. Começou a explorar a casa.
Alguns quartos que ele nunca tinha entrado e uma porta no final do corredor. O quarto da patroa, ele pensou. Damião não era um homem corajoso. Hesitava a cada passo. Abriu algumas portas, os quartos eram escuros. Tentou abrir uma janela. Trancada.
A cada quarto e a cada janela trancada ele se movia mais rápido, seus passos começaram a tropeçar, batia na parede, e nelas passava sua mão, como se procurando algum apoio, mas não encontrava.
Faltava a porta do quarto da patroa. Abriu. Para seu horror era um quarto completamente vazio. Não tinha cama, nem janelas, apenas a porta que estava aberta e ele parado. O desespero tomou conta. Bateu a porta e voltou pelo corredor, deveria ter um telefone na casa. Ele não tinha celular. Não achou nada.
Correu para a porta da saída. Trancada. As janelas da sala aonde ele havia passado boa parte do dia agora estavam fechadas e a casa entrou em um estado de escuridão. Sabia que tinha acabado de acordar, mas já estava escuro. E quem tinha trancado todas as janelas?
Damião procurou o interruptor para deixar as luzes acesas. A casa estava sem energia. Procurou uma bebida. Bebeu na boca. Passou outra vez pelo corredor dos quartos. Para seu assombro, as portas começaram a abrir e ele podia ouvir risadas que pareciam lamentos de agonia.
Tentou correr e caiu. Não podia estar acontecendo tudo isso com ele. Via rostos disformes aparecendo nas paredes e no chão. Não conseguia nem ao menos andar. Fez promessas de restaurar a fé que sua mãe havia ensinado, largou a garrafa. Chorou.
Alguns dias depois a polícia adentrou o apartamento. Damião jazia morto, com uma expressão de pavor que contorcia seu rosto. Em outro quarto a dona da casa estava morta com a mesma expressão. O inquérito da polícia identificou que a tinta que havia sido usada na casa, continha grande quantidade de uma substância ilegal, alucinógena e venenosa.
Anos depois a fábrica da tinta, comemorava o recebimento de um prêmio por ter plantado duas árvores.
Muito bom✨✨
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Que escrita mais envolvente e fascinante. É incrível como fui convidada a pensar junto, a cada passo que Damião dava, sentia meu coração acelerar um pouco e torci para que ele encontrasse a saída, talvez, de si mesmo. Tua escrita me lembrou a de um conto que gosto muito do Caio Fernando Abreu.
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Fico muito feliz com esse comentário! Uma pena que Damião não esteja mais aqui para ver que a história dele conseguiu envolver tanto. 😉
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Me adiciona no face rsrs
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